sábado, 31 de julho de 2010

PdC Agosto 2010



Estamos vivendo um período de acelerada evolução, de modo que a compreensão da sociedade que se vai compondo, é um verdadeiro desafio. Diante de tanto relativismo é necessário redescobrir aqueles valores fundamentais, que no passado vivificaram a convivência social.
Esses valores fundamentais dependem também de uma verdadeira imagem de Deus. O Papa Bento XVI, depois de afirmar que Deus é Amor (cf. 1 Jo 4, 16), diz que essas palavras exprimem com particular clareza o centro da fé cristã: a imagem cristã de Deus, e também a consequente imagem do homem e de seu caminho. (Deus caritas est, 1).
Jesus, sobretudo em seu evento pascal de paixão até ao aniquilamento do abandono e da morte, revela-nos Deus como Amor. Na Trindade, o Pai gera o Filho por amor, “perde-se” Nele, vive Nele, faz-se de certo modo “não-ser” por amor e, justamente por isso Ele é, é Pai. O Filho, enquanto eco do Pai, retorna por amor ao Pai, “perde-se” Nele, vive Nele, faz-se de certo modo “não-ser” por amor e, justamente, fazendo assim é, é Filho; o Espírito Santo, que é o recíproco amor entre Pai e Filho, seu vínculo de unidade, faz-se, Ele também, de certo modo, “não-ser” por amor e justamente por isso é, é o Espírito Santo.
O homem foi criado à imagem de Deus que é amor. Portanto, se nós percorrermos a estrada que nos faz sair de nós mesmos para doar-nos aos outros, então somos, porque nós somos se amamos, se vivermos pelos outros. Não fomos criados como indivíduos que antes se realizam e depois se doam, mas, desde a eternidade, fomos pensados por Deus na relação com os outros. Deste modo, podemos dizer que a relação possui uma prioridade ontológica: a nossa essência como pessoa, não se esgota no nosso ser, mas é definida pelas relações com Deus e com os outros.
Então, estabelecer relacionamentos autênticos com quem encontramos não é somente um gesto de cortesia, este é o nosso ser, a nossa vida. Portanto, eu irei realizar-me estando em relação com os outros: doando e também recebendo. De fato, experimentamos isto a cada dia e psicólogos e pedagogos ressaltam que é o outro que permite à nossa identidade afirmar-se e desenvolver-se. É no vulto do outro que eu me encontro.

A Igreja também é comunhão. Como sabemos, a “eclesiologia de comunhão”, como vocação da Igreja, representa “a idéia central dos documentos do Concílio Vaticano II” (Exortação Apostólica Christifidelis Laici, n. 19). A Igreja tem como vocação, ser “sacramento ou o sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano” (LG 1). A unidade da Igreja não é uniformidade, mas como na Trindade, seu modelo e forma, é “integração orgânica das legítimas diversidades; é a realidade de muitos membros unidos num só corpo, o único Corpo de Cristo (cf. 1Cor 12,12)” (Carta Apostólica Novo Millennio Ineunte, n. 46).
Duas coisas constituem o fundamento da centralidade da comunhão na Igreja. A primeira brota da essência da mensagem evangélica: a caridade é a essência da Igreja (cf. 1Cor 13,2). A segunda é que, se a caridade tem esta centralidade, não o é por uma opção convencional, mas porque o Amor constitui a própria vida de Deus (cf. l Jo 4,8.16), amor este que faz de Deus não um solitário, mas “família”, uni-trinitária. A Igreja encontra na Trindade as suas raízes, o seu “lugar”, o seu dever ser.


Padre Antonio Capelesso [Editorial Perspectivas de Comunhão - Ano XIX - Agosto de 2010 - n. 07]